RoboCop
não apenas é um reinício da franquia do policial ciborgue mais famoso do
cinema, como também é o primeiro filme do diretor brasileiro José Padilha (dos
sucessos Tropa de Elite 1 e 2) em
Hollywood. Mais do que isso. Além de Padilha, ver nomes como o de Lula Carvalho
como diretor de fotografia, Pedro Bromfman e Daniel de Rezende nos créditos
cuidando respectivamente da música e da edição deixa qualquer brasileiro cheio
de orgulho. Mas, afinal, do que se trata esse remake de RoboCop?
Na trama, o
conglomerado Omnicorp celebra o sucesso de seus soldados robôs na “pacificação”
de Teerã, no Irã. Pelas ruas da cidade, marcham dezenas de autômatos com
estatura e compleição humanoide, acompanhados pelos ED-209, verdadeiros tanques
sobre pernas, que escaneiam os cidadãos – visivelmente descontentes – em busca
de possíveis terroristas.
Narrando
a cena e acompanhando sua equipe de repórteres in loco, temos o apresentador Pat Novak (um exaltado Samuel L.
Jackson de peruca), que ressalta o quanto as máquinas da Omnicorp salvaram
vidas humanas e critica a “robofobia” estado-unidense. Uma nacional lei impede
que a empresa comercialize seus robôs militares no país. Enquanto isso, a
diretoria da companhia, chefiada por Raymond Sellars (Michael Keaton tão obstinado quanto em seus tempos de Bruce Wayne)
discute o quanto estão perdendo dinheiro sem poder vender robôs nos EUA e, em
certo ponto da conversa surge o plano de criar um produto – sim, o termo é esse
– que seja a fusão entre homem e máquina, derrubando a desconfiança que paira
sobre os robôs.
Enquanto
isso, acompanhamos o detetive Alex Murphy (Joel
Kinnaman da série de TV The Killing) e seu parceiro Jack Lewis (Michael K. Williams do oscarizado 12 Anos
de Escravidão) sendo repreendidos na delegacia de polícia por investigarem
por conta própria um conhecido traficante de armas, Antoine. Vallon (Patrick
Garrow, que coleciona papéis em séries como Nikita e Hannibal). Por conta
disso, Murphy e Lewis acabam arrumando alguns desafetos, que culminam no segundo
sendo baleado e no primeiro se tornando vítima de um atentado, com uma bomba em
seu carro. E, é a partir daí que o filme toma outro rumo, muito diferente do
RoboCop original que o holandês Paul Verhoeven (o Vingador do Futuro, Instinto Selvagem, Tropas Estelares) dirigiu
em 1987.
Parte homem, parte máquina
O
ponto crucial das diferenças na trama é que, ao contrário do Alex Murphy
imortalizado por Peter Weller em 1987 é que este RoboCop não morre para depois
voltar a vida como ciborgue. O detetive perde partes do corpo, principalmente
do lado esquerdo, e se encontra mergulhado em estágio vegetativo. É aqui, somos
apresentados ao doutor Dennet Norton (Gary
Oldman, que dispensa apresentações, em mais uma atuação sóbria e crucial).
O doutor Norton é o responsável pela Fundação Omnicorp, local aonde os diversos
recursos da empresa no campo da robótica para dar nova vida a pessoas que
tiveram membros amputados.
Bom, policial que sofreu atentado e está em coma praticamente inválido porque
investigava o tráfico de armas. Certamente o caso de Murphy cai como uma luva nos planos da empresa e eles
não perdem tempo em oferecer à sua esposa Clara (Abbie Cornish de Sem Limites e Sucker Punch – Mundo Sureal) a
possibilidade de ter pelo menos parte do marido de volta, mesmo que ele esteja,
digamos, diferente. Após certa hesitação ela aceita e é com essa escolha que o
remake se desvencilha de vez das amarras de ser totalmente fiel ao original.
A
transformação de Murphy em RoboCop no novo filme é um dos pontos de vista mais enfatizados
por Padilha. Assim, o que vimos de maneira corrida no original – e pela ótica
do próprio policial – é mostrado aqui em tom quase documental. Desde a primeira
armadura, que faz uma clara homenagem ao visual clássico do ciborgue até o
quanto o personagem é parte homem e parte máquina. Também vimos o quanto essa
nova versão evoluiu em termos de armamento quando Rick Mattox (Jackie Earl
Heley de Watchmen e do remake de A Hora do Pesadelo) lhe mostra seu novo
arsenal.
O
capacete agora está sempre incorporado á cabeça de Murphy e disponibiliza o
visor tático. Na perna direita, a boa e velha pistola de tamanho
desproporcional, convertida em um taser
para tonteio. Mas antes que os fãs xinguem, na perna esquerda está uma
submetralhadora dobrável, fazendo deste RoboCop mais letal do que nunca.
Produto da Omnicorp
No
Robocop original, ele era referido mais de uma vez como um produto da OCP, que
também controlava a polícia. Alex Murphy estava morto e a empresa fazia o
possível para se certificar de que continuasse, sempre monitorando a
programação no cérebro do ciborgue. Nesta verão, é justamente o oposto: é
importante que toda Detroit e a América saibam que o detetive é um milagre da
ciência, criado para manter a lei e trazer de volta o sorriso de sua família.
Há
um detalhe, inclusive, pouco explorado na trama que explora essa visão: a mão
direita do herói. Ao ver o filme, fica realmente difícil entender o por quê
mantê-la. Mas basta um pouco de reflexão para compreender a sacada. Afinal,
nada como um robô com toque humano para garantir a confiança de todos, não é
mesmo? Portanto, mesmo que carregue nos ombros a responsabilidade de um remake
e fugir das comparações seja uma tarefa impossível, o filme se sente livre para
ser novo em termos de abordagem e contar mais daqui em diante é estragar a
surpresa.
Não
há a violência caricata, ou as cenas “soltas” colocadas por Paul Verhoeven,
onde tudo era motivo para mostrar um herói metálico sentando o dedo em alguém no
meio de cidade em colapso. No lugar delas, a tensão gerada por sequências de
ação mais sóbrias, porém intensas, que contribuem à trama e estão inseridas no
contexto de uma cidade real dos EUA. E ainda que a ausência de cenas mais
fortes tenha baixado a classificação etária (14 anos no Brasil), o filme não
foi infantilizado de nenhuma forma.
No
final das contas, o RoboCop de José Padilha aborda os mesmos pontos do filme de
1987, como a relação de Alex Murphy com a família, e o conflito homem x
máquina. Estes, mesmo que aprofundados, não fecham o espaço para mostrar
corrupção, discutir os limites da ciência e questionar o corporativismo. Porém,
sem sangue em excesso ou aqueles programas de TV um tanto quanto perturbados no
meio da história, que por mais que sejam inteligentes, acabam “quebrando” a
narrativa. Agora, se isso faz dele melhor ou pior, quem vai decidir é você, depois
de assistir.
Comentário do Cineopses: texto do sempre bem-vindo Carlos Bazela! Valeu!
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