23 de junho de 2012

Toda forma de amor

Beginners (iniciantes). Esse é o título original do longa de Mike Mills que por aqui ganhou o nome de "Toda forma de amor (EUA,2010). Oliver (Ewan McGregor) é quem nos conta essa história, ou histórias para ser mais clara.
Depois de 44 anos de casamento, após a morte da esposa, seu pai Hal (Christopher Plummer) se assume gay, aos 75 anos. Nem bem a notícia é assimilada pelo nosso narrador, o mesmo pai descobre que tem câncer em estado terminal. Essas duas notícias vão dar o rumo da história inteira.

Oliver me parece um sujeito bem fechado, não gosta de se atrever ou arriscar. Leva a vida na maciota, sempre com a lembrança do casamento frustrado de seus pais (ainda que longo, o enlace não foi bacana). Essa convivência com a mãe, uma mulher que sabia da opção sexual do marido mas arriscou casar-se acreditando que o mudaria, marca Oliver para sempre, determinando sua personalidade.

Vemos seu pai, aos 75 anos, assumindo-se gay e se entregando completamente à um relacionamento com um homem mais novo, um recomeço maravilhoso, uma segunda chance ao amor. Vemos Oliver se apaixonar por uma atriz (Mélanie Laurent), uma garota aparentemente de bem com a vida mas tão profunda e marcada quanto Oliver.

O filme é uma belíssima ode ao recomeço, aos nossos e aos dos outros. À maneira como direcionamos nossas vidas e apostamos na tão esperada segunda chance e à maneira como encaramos o recomeço daqueles que nos cercam.

O roteiro é de uma simplicidade arrasadora. Uma trilha sutil, dedilhada, diálogos certeiros, uma narração mansa que dita o ritimo e nos envolve. Fora isso ainda temos um elenco monstruoso. O olhar profundo de McGregor arrebata a gente.  A tranquilidade ao contar os fatos, a maneira como aceita as decisões do pai (mesmo que as vezes não concordando) realmente convencem. Temos Mélanie, lindíssima, que perturba com uma presença que ao mesmo tempo quer passar alegria mas te deixa aquela sensação de uma máscara. E Christopher... sem palavras. Louvável. Merecidíssimo o reconhecimento com o Oscar de Melhor ator coadjuvante em 2012 além do Globo de Ouro.

Somos levados pelo narrador a acompanhar a história da morte de seu pai. Não é uma história triste, pelo contrário, é motivadora. Pela maneira como ele nos conta, óbvio há uma melancolia no ar afinal é o pai dele, mas a maneira como seu pai encarou esse recomeço é maravilhosa. Fiquei bem pensativa depois.

Uma cena em particular mexeu demais comigo: Oliver mostra a Mélanie o perfil que sei pai fizera para "atrair" interessados. Depois da leitura, ela com a voz embargada diz: "Ele não desistiu". Isso é, no mínimo, intrigante uma vez que a gente desiste tantas vezes de tantas coisas em um mesmo dia. Coisas pequenas mas que se somadas justificam um enorme pacote de oportunidades perdidas.

O filme nos mostra diversas versões de recomeços, de amores, de chances. Amor pela arte, pelo sonho, por um gracioso cahorro, pelo recomeço, pela fé, amor pelo medo (por que não?), amor fraterno, entre homem e mulher, entre amigos... enfim.

Assumo que fiquei bem comovida com o longa, que é alegre sem ser hilário, é melancólico sem ser triste e carrega uma mensagem linda sem ser enfadonho.
Dali concluimos que não importa a idade, somos sempre iniciantes nessa jornada. Vá ver e depois me conte.

beijo

18 de junho de 2012

Deus da carnificina

Acabei de ver, há exata 1 hora atrás, o novo filme de Roman Polanski. Só o nome do diretor já me dá uma vontade louca de ver, não interessa se é bom ou ruim. Felizmente, como quase tudo o que ele fez, o fime é mais uma prova de competência ma arte de contar uma boa história.

Não só a história. Os atores escolhidos são ninguém menos que Kate Winslet, Jodie Foster, Christoph Waltz e John C. Reilly. Mas vamos ao que interessa.
Tudo começa em um parque onde dois adolescentes brigam. Um bate, o outro apanha. Um pega um galho de árvore, o outro perde dois dentes. Enfim, mais um dia no parque. Logo depois estamos na casa do casal Longstreet (Foster e Reilly), que parecem estar fechando uma pauta do que depois viria a ser uma conversa "adulta" com os pais do agressor, o casal Cowan (Winslet e Waltz).

O que começa como uma conversa civilizada de pais tentando entender a atitude dos filhos se revela em um grande palco de diálogos impagáveis depois. O filme inteiro se passa na sala da casa do casal Longstreet.

De um lado temos pais que, inicialmente, medem as palavras para não acusar o filho do outro casal. Do outro, pais que tentam a todo custo não louvar a atitude violenta do filme. Junte a isso personagens únicos, cada um brilhando de maneira diferente com interpretações impagáveis. 

Minha percepção é que o filme é um embate de paradigmas. Temos Penelope Longstreet (Foster) como uma mãe preocupada com a fome mundial, a situação dos países africanos e o espírito de coletividade. Seu marido (Reilly) aparentemente é um homem submisso, que acata e defende tudo que sua mulher fala. Alan Cowan (Waltz) é um advogada ocupado que não parece se importar muito com o tema discutido na sala. Finalmente temos Nancy Cowan (Winslet) uma corretora de seguros fina e contida.

Os papéis caem quando a situação foge do controle na sala. Quando as crianças já não são o centro das atenções mas sim as vidas dos casais presentes, a coisa fica bem feia. Vemos que uma pessoa preocupada com questões sociais não é bem um ser coletivo. O maridão submisso resolve mostrar quem realmente é, um ogro de mão cheia. O casal fino e requintado não tem a menor educação ou senso de justiça. Entre acusações, náuseas, choro e bebedeira temos a impressão de estar no teatro.

O filme é baseado na peça "God of Carnage" de Yasmina Reza, que também assina o roteiro, e é mais uma prova que no final do dia, o que segura mesmo um bom filme são seus personagens e um roteiro sólido. Não se engane ao pensar que, por ter apenas um cenário, o longa é chato é monótono. O que não falta na obra de Polanski são momentos de tensão, diálogos ricos em acidez, e também em falsidade, e com certeza ótimas gargalhadas.

beijo