22 de outubro de 2009

Katyn

História sempre exerceu um fascínio gigantesco sobre mim. Não que eu tenha alguma veia maléfica e adore a desgraça alheia mas,em especial,as partes da história mundial que contam guerras, grandes revoltas e revoluções prendem minha atenção. Se são contadas em forma de filme então... vixi! Daí esquece. Nem pisco com medo de perder alguma coisa (rs). Quem curte esse assunto com certeza já viu películas e mais películas sobre o massacre nazista,todas aquelas mortes,a bárbarie e o horror. Outras produções retratam a angústia dos que sofreram com essa opressão,algumas ainda são relatos de quem viveu isso (vide O Pianista, da Roman Polanski - ele viveu aquele horror todo ainda menino e perdeu os pais nesse período também). Enfim, muitas são as opções para se inteirar sobre o assunto e hoje eu lanço mais uma dica.

O longa polonês Katyn ( Katyn, 2007) não vai contar a história desde quando a Alemanha invadiu a Polônia e exterminou todos os judeus de lá. Seguindo uma linha onde não há personagem central e sim diversas histórias paralelas o filme mostra o cenário polonês depois que os alemães caíram fora. Só pra lembrar,em agosto de 1939 a Polônia foi invadida pelos nazistas e um mês depois pelos soviéticos (que ficaram meio que em cima do muro não declararam guerra à Polônia e ainda fingiam lutar ao lado deles pela desocupação). Enfim, em 1945 depois da retirada das tropas nazistas,um distinto cidadão conhecido por Stalin levantou a bandeira do "ei poloneses eu sou muito gente boa e botei os alemães pra correr. Quem quer ser meu amigo!?". Acontece que nesse meio tempo o exército polonês já era refém dos soviéticos e cerca de 500 deles foram deportados para a Sibéria.

Daí permanecia a dúvida. Se a guerra acabou por que então nossos soldados não voltam pra casa? O longa do polonês Andrzej Wajda tem foco justamente nessa "mentirinha" sobre a bondade de Stalin. Cerca de 20mil soldados polacos foram enviados a floresta de Katyn (daí o título) .Entre esses soldados está o jovem oficial Andrzej (Artur Zmijewski) que, apesar dos pedidos de sua esposa Anna (Maja Ostaszewska), permanece no caos da situação, ao lado dos companheiros de exército. Esses soldados são mantidos como prisioneiros e o filme se baseia nos relatos do oficial Andrzej que foi anotando tudo em um diário que,mais tarde, fora enviado a sua esposa.

Em Katyn, aproximadamente 15 mil soldados poloneses foram executados com um tiro na nuca (algumas fontes registram que tenham sido mais de 25mil). Há um tom de documentário nesse longa, e pra quem gosta de história é um prato cheio. Dá pra ver paixão no filme, não de romance mas paixão na produção sabe. Acho que por se tratar de várias histórias paralelas a gente meio que se envolve e sente o drama tanto dos que foram tanto das famílias que ficaram. Depois de ver esse filme acabei descobrindo que o próprio diretor também viu isso de perto. Pelo que li depois, seu pai Jakub Wadja, foi um dos oficiais executados em Katyn e sua mãe, Aniela, foi uma das mulheres que esperaram pelos maridos - exatamente o ponto de vista narrativo do filme.
Havia entre os que ficavam um dúvida sobre a verdadeira origem dos assassinatos. Houve os que ousaram acusar Stalin e foram mortos obviamente, como houve, também, os que se calaram diante disso tudo e optaram por suas vidas. O filme é quase uma homenagem aos que não se calaram e fizeram questão de escancarar o crime que Stalin tanto tentou esconder, culpando os nazistas pelos assassinatos cometidos por ordem dele. Também abre o debate: seria melhor encarar tudo e gritar aos quatro ventos que Stalin era o verdadeiro mentor dos crimes cometidos em Katyn ou aceitar as mortes e tentar levar a vida?

Prometo que está acabando, mas acho interessante lembrar que foi nesse cenário que Karol Józef Wojtyła (ou Papa João Paulo II) cresceu. Nessa bárbarie toda estudou em seminários clandestinos e também perdeu parentes na II Guerra. Além de tudo o que eu já escrevi (abusei, assumo e peço desculpas!) ,Katyn ainda teve indicação ao Oscar de 2008 como Melhor Filme Estrangeiro.
Fica a minha dica, vale cada um dos 118min de exibição.
Beijocas

14 de outubro de 2009

Deixa ela entrar

Eu juro que por tudo que já havia lido sobre a produção sueca Deixa ela entrar (Låt Den Rätte Komma In/ Let the Right One in, 2008) eu confesso que, como tontinha que sou, achei que fosse sair de lá aos berros e morrendo de medo. Afinal só no cartaz a gente já lê coisas do tipo "o melhor filme sobre vampiros de todos os tempos" ou " assustador" e por aí vai. O gênero foi classificado como terror mesmo e depois de ver, confesso à vocês fiéis leitores, que se trata de uma produção brilhante. Os mais conservadores que me desculpem mas acho que há muito tempo não se via um filme de terror tão sofisticado e ao mesmo tempo tenso e assustador como esse. O último que me lembro é O Bebê de Rosemary (do no nosso mais novo pedófilo Roman Polanski).
Deixa eu contar como é. O filme se passa em 1982, no subúrbio de Estocolmo. O foco é o menino Oskar (Kåre Hedebrant) um frágil e tímido garoto de 12 anos, que apanha dos colegas na escola, tem uma família desestruturada e não tem amigos. Passa o tempo livre sozinho imaginando como seria bacana se vingar dos panacas que o azucrinam na escola e outras coisas mais. Na paisagem super gelada da cidade, neve para todo o lado eis que ele conhece sua nova vizinha Eli (Lina Leandersson) que também tem 12 anos mas.... é uma vampira.

Oskar não sabe disso até certo momento do filme e a química entre eles é instantânea. Aí é que entra a delicadeza e o cuidado do diretor ao retratar essa relação fora do comum , digamos assim, sem se esquecer de que a nossa garotinha é chegada num sanguinho de vez em quando.
O terror fica mais na nossa expectativa e imaginação. Claro que há uns pulinhos na cadeira de vez em quando , mas nada de visceras pra um lado, tiros e água benta pro outro e por aí vai. A coisa é mais intensa, mas profunda e mexe mesmo com a gente. O filme não aborda apenas o estado vampírico da nossa amiguinha, há outros temas que são tocados de maneira sutil mas o espectador saca na hora. Por exemplo, uma coisa que me chamou muita atenção foi o fato da aceitação. Mesmo depois de presenciar a força que sua aparentemente frágil amiga possuía, de vê-la lambendo o sangue que caia de suas mãos, Oskar continuava encantado por Eli.

Eles se descobriram juntos, afinal ela já tinha 12 anos há muito tempo, e aprenderam a lidar com as questões universais da pré-adolescência juntos. Há um climinha de romance no ar (calma não pense que eu sou pervertida) mas os dois acabam se completando.
Ela encoraja Oskar a se impor, a levantar a cabeça e não levar desaforo pra casa enquanto ele lhe ensina coisas simples mas essesnciais para uma garota de 12 anos, como diálogos secretos por toques nas paredes, brincadeiras simples mas que faziam dos dois um complemento necessário um para o outro. Para mim a intenção do diretor não era mesmo assustar e sim fazer a turma refletir através de um gênero que, cá entre nós, não foi feito pra isso. Mas a coisa deu certo e eu finalmente entendi todos os elogios do cartaz. Vai ver a gente se assusta com o ser humano mesmo, aquela vampirinha tinha mais sentimentos que muita gente que eu conheço mas enfim, isso fica pra próxima.Fora isso ainda há o sacrifício pelo que se ama, a quebra de pré-conceitos; a conquista e mais uma diversidade de assuntos que são mostrados durante os 114 minutos de exibição

E não se engane achando que é mais uma produção pegando onda na febre dos vampiros. Nada disso, como eu disse antes, é algo mais sofisticado (e não tomem isso por chato hein!)

Confiram a produção e depois me contem. É de uma simplicidade e objetividade assustadoras.

beijinhos

2 de outubro de 2009

Nossa natureza selvagem

Eu demorei pra falar desse filme aqui, mas chegou a hora. Finalmente aconteceu algo que me fez tomar essa atitude tão nobre e tardia (rs!). Essa semana eu ganhei de duas pessoas lindas o livro que deu origem ao filme Na natureza selvagem (Into the wild, EUA 2007). É o diário de Christopher McCandless que depois de se formar resolve largar tudo e descobrir a natureza. O largar tudo é no sentido mais literal da palavra, só com uma mochila nas costas, sem dinheiro e com a cara e a coragem ele parte em busca daquilo que considera liberdade.
Chris é interpretado pelo sensacional Emile Hirsch que apesar da pouca idade já provou ser mais que um rostinho bonito. E é bem engraçado o que nós consideramos liberdade, a ideia que temos da tal felicidade.Isso fica muito explícito no filme, essa busca sem fim, essa angústia, esse anseio pelo novo.

Ah, antes que você pense que deve ser um puta filme sem graça, deixa eu dizer uma coisa. Quando Chris sai em busca desse ideal de liberdade, a reflexão que fica é: Quem é que nunca teve vontade de sumir no mundo? Sei lá, depois de levar um pé a bunda, perder o emprego, fazer a maior burrada da história, perder alguém querido, enfim são inúmeras as situações que já nos fizeram pensar nisso.
Nessa longa caminhada ele encontra diversas pessoas, faz paradas mais longas em determinados lugares, tem contato com muitas culturas diferentes e sempre escrevendo para sua irmã, que sofre aguardando notícias ao mesmo tempo que se alegra pela conquista do irmão. Nosso amigo fugia de uma carreira já planejada pelos pais, um futuro promissor e executivo nos negócios da família.
A trajetória desse desbravador é embalada por uma trilha fantástica composta por Eddie Vedder (do Pearl Jam) e tudo isso orquestrado pelo genial Sean Penn que aqui mostra mais uma vez que leva jeito e muito jeito para direção.
Ele soube com maestria mostrar a angústia do protagonista e a necessidade em sair em busca de aventura, necessidade de se conhecer mesmo, de saber que é possível viver sem ser escravo do capitalismo, do consumismo do "que quero isso".

O problema, e eu nem sei mesmo se é um problema, é que quando Chris decidiu o que queria fazer, idealizou a sua tão sonhada felicidade se trancou para o resto. O filme toca nessa questão delicada também, da ambição em alcançar um objetivo e se esquecer de todo o ambiente que nos cerca. Nesse caso família, amigos, amores e outros. Uma cena que mostra muito isso é quando ele encontra um senhor que já desistiu da vida estava , como diria Raul " sentado no trono de um apartamento com a boca escancarada cheia de dentes esperando a morte chegar". Para os dois o encontro foi marcante.De uma lado alguém ávido pela vida, do outro alguém que já havia desistido há muito tempo. Esse conflito mexe com a gente, os diálogos, os argumentos e as defesas apresentadas por eles realmente fazem a gente parar pra pensar um pouquinho.

A paisagem nem preciso dizer é deslumbrante, e tudo isso foi registrado em no diário do moço, que como disse antes já virou livro. Ele enfim chegou ao lugar onde tanto queria, viveu as emoções que esperava mas... de repente não tinha ninguém pra dividar tudo isso. Quando nosso Chris se deu conta estava sozinho, com uma carga de emoções tremenda e o lápis já não bastava para extravasar as emoções. Infelizmente quando ele descobriu isso já era tarde. Em seu caminho, não soube separar as frutinhas vermelhas das mais claras. Fica a dica então, ambição é ótimo, querer crescer e melhorar é sensacional. Cultivar um ambiente e pessoas com quem se possa contar nessas e para essas conquistas é imprescindível.

Nota: quem ver o filme vai entender o lance das frutinhas vermelhas.
beijocas